quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

amanhecer capitulo 19


adLIVRO TRÊS – BELLA
Afeto pessoal é um luxo que você só pode ter quando todos os seus inimigos estiverem
eliminados. Até que isso aconteça, todo mundo que você ama é um refém, esgotando sua
coragem e corrompendo seu julgamento.
Orson Scott Card
Empire
PREFÁCIO
Não mais um pesadelo, a linha negra avançou para nós através da névoa gelada espalhado
aos pés deles.
Nós vamos morrer, eu pensei em pânico. Eu estava desesperada pela preciosidade que eu
guardava, mas até mesmo pensar que aquilo era um lapso de atenção, eu não poderia aceitar.
Eles se aproximaram, suas capas pretas se balançando devagar com o movimento. Eu vi as
mãos deles com garras amareladas. Eles se afastaram, inclinando-se sobre nós por todos os lados.
Nós éramos muitos. Estava acabado.
E então, como um turbilhão de luz, a cena inteira estava diferente. Nada tinha mudado ainda
- os Volturi ainda estavam parados perto de nós, prontos pra matar. Tudo que realmente mudou
foi com a cena parecia pra mim. De repente, eu estava querendo aquilo. Eu queria que eles
atacassem. O pânico se transformou em sede de sangue assim que eu me inclinei pra frente, um
sorriso em meu rosto, e um rosnado saiu pelos meus dentes a mostra.
19 – QUEIMANDO
A dor era enlouquecedora.
Exatamente isso - eu estava enlouquecendo. Eu não conseguia entender, não fazia sentido o
que estava acontecendo.
Meu corpo tentava rejeitar a dor, e eu era sugada de novo e de novo pra uma escuridão que
cortar alguns segundos, e até minutos da agonia, fazendo ser mais difícil ser racional.
Eu tentei separá-las.
A surrealidade era negra, e não doía tanto.
A realidade era avermelhada, e era como se eu estivesse sendo serrada ao meio, atingida
por um ônibus, socada por um premiado lutador, atropelada por búfalos, e submersa em ácido,
tudo ao mesmo tempo.
Na realidade eu estava sentindo meu corpo girar e pular enquanto não era possível que eu
me movesse por causa da dor.
Na realidade eu sabia que havia algo muito mais importante que toda aquela tortura, mas
não era capaz de me lembrar o que.
A realidade meio rápida demais.
Um momento, tudo estava como devia estar. Rodeada de pessoas que eu amava. Sorrisos.
De alguma forma, incomum como essa, era como se eu fosse conseguir tudo pelo que eu estive
lutando.
E então, uma coisinha deu errado.
Eu vi quando o meu copo tombou, sangue escuro se espalhando e manchando o branco
perfeito, e eu cambaleei instintivamente. E eu vi os outros, mãos ágeis, mas meu corpo continuava
se esticando...
Dentro de mim, alguma coisa se moveu em outra direção.
Rasgando. Quebrando. Agonia.
A escuridão tomou tudo, e foi lavado por uma onda de tortura. Eu não podia respirar - eu
tinha me afogado uma vez, mas era diferente agora; estava muito quente a minha garganta.
Pedaços de mim partindo, rasgando, despedaçando...
Mais escuridão.
Vozes dessa vez, gritando, quando a dor voltou.
- A placenta tem que ser aberta!
Algo mais afiado que uma faca me cortou - as palavras, fazendo mais sentido que outras
torturas. Placenta rasgada - eu sabia o que aquilo significava. Significava que meu bebê estava
morrendo dentro de mim.
- Tire-o daí! - Eu gritei pra Edward. Por que ele ainda não tinha feito isso? - Ele não
consegue respirar! Faça isso agora!
- A morfina-
Ele queria esperar, me dar remédios pra dor, enquanto nosso bebê morria?
- Não! Agora - Eu me contorci, incapaz de continuar.
Pontos negros cobriram a luz da sala quando um ponto frio de uma nova dor apareceu no
meu estômago. Doía muito - eu me encolhi automaticamente pra proteger minha barriga, meu
bebê, meu pequeno Edward Jacob, mas eu estava fraca. Meus pulmões sopraram o oxigênio pra
fora.
A dor sumiu de novo embora eu tivesse me acostumado a ela. Meu bebê, meu bebê,
morrendo..
Quanto tempo havia passado? Minutos ou segundos? A dor tinha ido embora. Névoa. Eu não
podia sentir. Eu não podia enxergar, também, mas eu conseguia escutar. Havia ar nos meus
pulmões de novo, como bolhas ásperas subindo e descendo na minha garganta.
- Você fica comigo agora, Bella! Você tá me ouvindo? Fica! Você não vai me deixar!
Mantenha seu coração batendo!
Jacob? Jacob ficou ali, tentando me salvar.
Claro, eu queria dizer pra ele. Claro que eu manteria meu coração batendo. Eu não tinha
prometido pra eles dois?
Eu tentei sentir meu coração, encontrar a pulsação, mas estava perdida no meu próprio
corpo. Eu não conseguia sentir as coisas que eu deveria, e nada parecia estar no lugar certo. Eu
pisquei e encontrei meus olhos. Eu podia ver a luz. Não era o que eu procurava, mas era melhor
que nada.
Enquanto os meus olhos lutavam pra se ajustar, Edward sussurrou, - Renesmee.
Renesmee?
Não era o pálido e perfeito filho que eu imaginava? Eu senti um momento de choque. E
então, me enchi de calor.
Renesmee.
Eu tentei mover os meus lábios, tentei fazer com que as bolhas de ar se transformassem em
sussurros na minha língua. Eu forcei minhas mãos dormentes a se esticar.
- Me dê... Me dê ela.
A luz dançou, passando pelas mãos de cristal de Edward. Os reflexos estavam tingidos de
vermelho, com o sangue que cobria sua pele. E mais alguma coisa vermelha em suas mãos.
Alguma coisa pequenina e forte, pingando sangue. Ele colocou o corpinho quente nos meus braços
fracos, quase com se eu a estivesse segurando. A pele molhada dela estava quente - quente como
Jacob.
Meus olhos focara; de repente estava tudo claro.
Renesmee não chorou, ela respirou rapidamente, assustada. Seus olhos estavam abertos,
sua expressão tão assustada que chegava a ser engraçada. A pequenina e perfeita cabecinha
estava coberta com por uma pequena camada de cabelo, molhado de sangue. Seus olhos eram de
um familiar - mas surpreendente - cor de chocolate. Sob o sangue, a pela dela parecia pálida, um
tom de mármore. Tudo, a não ser suas bochechas, que estavam coradas.
Seu rostinho era tão absurdamente perfeito que isso que isso me pegou de surpresa. Ela era
ainda mais bonito que o próprio pai. Inacreditavelmente. Impossível.
- Renesmee - eu suspirei. - Tão.. linda.
Aquele rostinho de repente sorriu - um largo sorriso. Por trás de seus lábios rosados havia
um complemento de dentes branquinhos como a neve.
Ele encostou a cabeça no meu peito, aconchegando-se no calor. Sua pele estava quente e
sedosa, mas ela não cedeu como a minha.
Então, havia dor de novo - apenas uma onda quente. Eu ofeguei.
E ela tinha ido embora. Meu bebê com carinha de anjo não estava em lugar algum. Eu não
podia vê-la ou sentí-la.
- Não - Eu quis gritar. - Devolvam-na pra mim!
Mas a fraqueza era maior. Meus braços pareciam mangueira de plástico por um momento, e
depois não pareciam com nada. Eu não conseguia sentí-los. Eu não conseguia me sentir.
A escuridão invadiu meus olhos mais fortemente que antes. Como uma cegueira, firme e
rápida. Cobrindo não apenas os meus olhos, mas a mim completamente, com um peso
esmagador. Era cansativo lutar contra aquilo. Eu sabia que seria fácil demais me render. Deixar a
escuridão me esmagar, me levar pra um lugar onde não haveria dor, cansaço, preocupações ou
medo.
Se fosse apenas eu, eu não seria capaz de resistir por muito tempo. Eu era apenas humana,
com nada mais que força humana. Eu vinha tentando lidar com o sobrenatural há muito tempo,
como Jacob disse.
Mas não era apenas eu.
Se eu tivesse feito a coisa mais fácil agora, deixado o vazio negro me extinguir, eu os
machucaria.
Edward. Edward. A minha vida e a dele se tornaram uma coisa só. Acabe com um, e então,
os dois acabam. Se ele tivesse ido embora, eu não seria capaz de sobreviver. Se eu tivesse ido, ele
não sobreviveria, também. Um mundo sem Edward era completamente vazio. Edward tinha que
existir.
Jacob - que disse adeus pra mim várias e várias vezes, mas sempre voltada quando eu
precisava. Jacob, que eu tinha maoado tantas vezes, um crime. Eu o magoaria de novo, ainda
mais profundamente? Ele ficou aqui por mim, apesar de tudo. Agora, tudo o que ele pediu era que
eu ficasse por ele.
Mas estava tão escuro que eu não podia ver nenhum deles. Nada parecia real. Isso fez ser
mais difícil não desistir.
Eu continuava me empurrando pela escuridão, embor quase num reflexo, eu não estivesse
tentando levantá-lo. Eu estava apenas resistindo. Não permitindo que ele me esmagasse
completamente. Eu não era um Atlas, e a escuridão parecia pesada como um planeta; eu não
conseguia carregá-la. Tudo o que eu podia era não ser completamente envolvida.
Era como um modelo pra minha vida - eu nunca foi forte pra lidar com coisas fora do meu
controle, atacar inimigos ou fugir deles. Evitr a dor. Sempre humana e rfaca, a única coisa que eu
sempre fui capaz era de contiuar no que eu me propunha. Suportar. Sobreviver.
Tinha sido o suficiente até esse momento. Teria que ser o suficiente hoje. Eu suportaria até
que a ajuda chegasse.
Eu sabia que Edward estaria fazendo tudo o que ele podia. Ele não desistiria.
Nem eu.
Eu tinha domado a escuridão da não-existência por centímetros.
Não era o suficiente - aquela determinação. Enquanto o tempo passava, a escuridão
retomava o poder, eu precisava tirar forças de alguma coisa.
Eu não podia sequer imaginar o rosto de Edward. nem de Jacob, Alice, Rosalie, Charile ou
Renée, Carlisle ou Esme.. nada. Isso me horrorizou, e eu me perguntei se era tarde demais.
Eu senti que estava escorregando - não havia nada a que eu pudesse me agarrar.
Não! Eu tinha que sobrevive a isso. Edward dependia de mim. Jacob. Charlie, Alice, Rosalie,
Renée, Esme...
Renesmee.
E então, embora eu ainda não conseguisse ver nada, de repente eu podia sentir alguma
coisa. Como braços fantasma, eu supus que eu podia sentir meus braços de novo. E neles, algo
pequeno e duro, e muito, muito quente.
Meu bebê. Meu pequeno chutador.
Eu tinha conseguido. Apesar das possibilidades, eu tinha sido forte o bastante pra
Renesmee, pra cuidar dela até que ela ficasse forte o bastante pra viver sem mim.
Aquele ponto quente nos meus braços parecim tão reais. Eu os trouxe mais pra perto.
Estava exatamente onde meu coração devia estar. Me agarrando fortemente à memória de
minha filha, eu sabia que seria capaz de lutar contra a escuridão o quanto fosse necessário.
Mais quente.
Desconfortável agora. Muito quente. Muito, muito quente.
Como pegar no lado errado de um ferro de passar - minha reposta automética foi tentar tirar
aquilo do meu braço. Mas não havia nada em meus braços. Meus braços não estavam apoiados no
meu peito. Meus braços eram coisas mortas, jogadas em algum lugar ao meu lado. A quentura
estava dentro de mim.
A queimação aumentou - aumentava ao máximo e depois aumentava mais até que
ultrapassasse pra algo que eu jamais senti.
Eu senti o pulse sob o fogo crescente no meu peito e eu vi que havia encontrado meu
coração de novo, no momento em que eu desejava jamais tê-lo feito. Desejava que eu tivesse
abraçado a escuridão enquanto eu tive a chance. Eu queria levantar meus braços e abrir o meu
peito e tirar meu coração de lá - qualquer coisa pra parar com essa tortura. Mas eu não sentia os
meus braços, não podia mover sequer um dedo.
James, quebrando a minha perna com seus pés. Não era nada. Aquilo foi como dormir numa
cama de penas. Eu preferia aquilo, cem vezes. Cem fraturas. E ainda seria grata.
O bebê, quebrando as minhas costelas, abrindo caminho pra ela dentro de mim, pedaço por
pedaço. Aquilo não era nada. Era como boiar numa piscina de água gelada. Eu preferia aquilo, mil
vezes. E seria grata.
O fogo ficava mais quente e eu queria gritar. Implorar pra que alguém me matasse agora,
antes que eu vivesse mais um segundo naquele sofrimento. mas eu não conseguia mover meus
lábios. O peso ainda estava ali, me esmagando.
Eu percebi que não era mais a escuridão pesando; era o meu corpo. Muito pesado. Me
consumindo em chamas que se diriam pro meu coração agora, espalhando uma enorme dor nos
meus ombros e estômago, escolhendo seu caminho pela minha garganta, indo pro meu rosto.
Por que eu não conseguia me mover? Por que eu não conseguia gritar? Isso não fazia parte
das histórias.
Minha mente estava insuportavelmente clara - possibilitada pela dor feroz - eu vi que as
respostas quase ao mesmo tempo em que formulei as perguntas.
A morfina.
Parecia que tinha sido há milhões de anos atrás que nós tínhamos conversado sobre isso -
Edward, Carlisle e eu. Edward e Carlisle espervam que remédios pra dor ajudassem a combater a
dor do veneno. Carlisle tentou com Emmett, mas o veneno queimou o medicamento, selando suas
veias. Não houve tempo pra que ele se espalhasse.
Eu mantive o meu rosto suave e concordei, agradecendo às minhas estrelinhas da sorte que
Edward não pudesse er a minha mente.
Porque eu tinha veneno e morfina, juntas, não meu corpo antes, e eu sabia a verdade. Eu
sabia que o torpor do medicamento era completamente irrelevante enquanto o veneno percorria
minhas veias. Mas eu não mencionaria esse fato. Nada que fizesse ele mais indisposto a me
transformar.
Eu não pensei que a morfina fosse ter esse efeito - que me deixasse lerda. Me deixasse
paralisada enquanto eu queimava.
Eu sabia das histórias. Eu sabia que Carlisle teve que ficar quieto o bastante pra evitar ser
descoberto enquanto ele queimava. Eu sabia que, de acordo com Rosalie, não melhorava gritar.
Eu esperava conseguir ser como Carlisle. Que eu pudesse acreditar nas palavras de Rosalie e
manter a minha boca fechada. Porque eu sabia que cada grito que saísse da minha boca iria
atormentar Edward.
Agora parecia uma piada terrível, que eu estivesse finalmente tendo o que eu queria.
Se eu não conseguia gritar, como eu diria a eles pra me matarem?
Tudo o que eu queria era morrer. Nunca ter nascido. Toda a minha existência não pesava
mais que essa dor. Não valia a pena viver nem por mais uma batida do coração.
Me deixe morrer, me deixe morrer, me deixe morrer.
E, por um espaço de infinito, aquilo era tudo. Só a intensa tortura, meus grunhidos
inaudíveis, implorando pra que a morte viesse. Nada mais, nem mesmo tempo. E aquilo era
infinito, sem apelações e sem fim. Um momento infinito de dor.
A única mudança veio quando, de repente, meu sofrimento foi dobrado. A parte de baixo do
meu corpo, anestesiada antes mesmo da morfina, repentinamente começou a queimar também.
Alguma parte quebrada tinha se colado - unidas pelas brasas do fogo.
O fogo infinito aumentava.
Pode ter durado segundos ou dias, semanas ou meses, mas eventualmente, o tempo parecia
dizer algo de novo.
Três coisas aconteceram juntas, crescendo individualmente de modo que eu não soubesse o
que tinha vindo primeiro: o tempo voltou, o poder da morfina passou, e eu fiquei mais forte.
Eu podia sentir o controle do meu corpo voltando pra mim com incrementos, e esses
incrementos eram o que faziam o tempo passar. Eu sabia disso quando eu fui capaz de mexer
meus dedos do pé e fechar as mãos. Eu sabia disso, mas não fiz. Embora o fogo não tivesse
diminuído sequer um grau - na verdade, eu comecei a desenvolver uma nova capacidade de
tolerar isso, uma sensibilidade em apreciar, separadamente, cada gota de fogo que corria pelas
minhas veias - eu descobri que podia pensar naquilo.
Eu podia lembrar porque eu não devia ter gritado. Eu podia lembrar porque eu me
comprometi a suportar a insuportável agonia. Eu podia lembrar que, embora isso parecesse
impossível agora, havia algo que valeria a pena a tortura.
Isso aconteceu na hora certa pra mim, quando o peso deixou o meu corpo. Pra qualquer um
que estivesse me vendo, não haveria nenhuma mudança. Mas pra mim, que lutei pra manter os
gritos e dores dentro de mim, onde eles não magoariam ninguém, pareceu que eu tinha me
liertado da estaca a qual eu estava amarrada e queimando, me agarrei àquela estaca pra me
suportar naquela chama.
Eu tinha força suficiente pra ficar deitada ali imóvel enquanto a vida queimava em mim.
Minha audição foi ficando cada vaz mais clara, e eu poderia contar as batidas frenéticas do
meu coração, pra marcar o tempo.
Eu poderia contar as respirações que ofeguei pelos meus dentes.
Eu poderia contar os ruídos, até mesmo respirações que vinham de algum lugar perto de
mim. Elas se moviam devagar, então eu me concentrei neles. Eles ficam a maior parte do tempo
passando. Mais até que o pêndulo de um relógio, aquelas respirações me ajudaram a superar a
queimação até o fim.
Eu continuava a ficar forte, meus pensamentos mais claros. Quando nossos sons apareciam,
eu podia escutar.
Havia passos, o sopro do vento quando uma porta se abria. Os passos foram ficando mais
perto, e eu senti a pressão contra o meu pulso. Eu podia sentir o dedos gélidos. O fogo apagou
todas as memórias do frio.
- Ainda não mudou?
- Não.
A suave pressão, respirando contra minha pele incandescente.
- Não há nenhum um traço de morfina.
- Eu sei.
- Bella? Você pode me ouvir?
Eu sabia, acima de qualquer dúvida, que se eu abrisse a minha boca, eu perderia - eu
grunhiria e gritaria e me contorceria e debateria. Se eu abrisse meus olhos, se eu movesse sequer
um dedo - qualquer mudança ficaria fora do meu controle.
- Bella? Bella, amor? Você pode abrir seus olhos? Você pode apertar a minha mão?
Pressão nos meus dedos. Era difícil não responder a voz, mas eu continuei paralisada. Eu
sabia que a dor em sua voz não era nada comparada ao que ele poderia vir a sentir. Naquele
momento tudo o que ele temia era que eu estivesse sofrendo.
- Talvez... Carlisle, talvez seja tarde demais. - As voz dele amorteceu; e se quebrou na
palavra tarde.
Minha decisão oscilou por um instante.
- Ouça o coração dela, Edward. Está mais forte que o de Emmett jamais esteve. Eu nunca
ouvi nada tão vital. Ela vai ficar bem.
Sim, eu estava certa em ficar quieta. Carlisle o tranqüilizaria. Ele não precisava sofrer
comigo.
- E a coluna dela?
- Os ferimentos dela não eram muito piores que os de Esme. E o veneno vai cura-la assim
como fez com Esme.
- Mas ela está tão quieta. Eu devo ter feito algo errado.
- Ou algo certo, Edward. Filho, você fez tudo o que eu poderia ter feito e mais. Eu não sei se
seria tão persistente, a fé que você teve. Pare de se culpar. Bella vai ficar bem.
Um longo suspiro. - Ele deve estar em agonia.
- Nós não sabemos disso. Ela tinha muita morfina em seu corpo. Nós não sabemos o efeito
que isso vai ter na experiência dela.
Um leve toque na parte de dentro do meu braço. Outro suspiro. - Bella, eu te amo. Bella, me
desculpe.
Eu queria muito respondê-lo, mas eu não faria a dor dele piorar. Não enquanto eu tivesse
força pra me manter imóvel.
Nisso tudo, o torturante fogo continuou me queimando. Mas havia muito mais espaço na
minha cabeça agora. Espaço pra refletir sobre a conversa deles, pra lembrar do que aconteceu,
pra pensar no futuro, e com espaço de sobra pra sofrer.
Também, espaço pra preocupação.
Onde estava meu bebê? Por que ela não estava aqui? Por que eles não estavam falando
sobre ela?
- Não, eu vou continuar aqui - Edward suspirou, respondendo um pensamento. - Eles vão
entender.
- Uma situação interessante - Carlisle respondeu. - E eu pensei que já tinha visto de tudo.
- Eu vou ver isso depois. Nós vamos lidar com isso. - Alguma coisa apertou minha mão.
Edward suspirou. - Eu não sei de qual lado ficar. Eu gostaria de bate em ambos. Bom, mais
tarde.
- Eu me pergunto o que Bella vai pensar - de qual lado ela vai ficar - Carlisle meditou.
Uma baixa, forte risada. - Eu tenho certeza que ela vai me surpreender. Ela sempre me
surpreende.
Os passos de Carlisle desapareceram de novo, e eu estava frustrada que não houvesse
maiores explicações. Ele estavam falando misteriosamente pra não me aborrecer?
Eu voltei a contar as respirações de Edward pra contar o tempo.
Dez mil, novecentos e quarenta e três respiradas depois, um diferente conjunto de passos
percorreu a sala. Mais claras. Mais... ritmadas.
Estranho que eu pudesse diferenciar as diferenças entre os passos que eu nunca fui capaz
de ouvir antes de hoje.
- Quanto tempo mais?
- Não vai demorar muito agora - Alice disse a ele. - Está vendo quão clara ela está ficando?
Eu consigo vê-la bem melhor. - Ela suspirou.
- Ainda sentindo um pouco amarga?
- Sim, obrigada por me lembrar disso - ela resmungou. - Você ficaria mortificado também, se
você percebesse o que está preso por sua própria natureza. Eu vejo melhor os vampiros, porque
eu sou uma; eu vejo bem os humanos, porque eu fui uma. Mas eu não vejo esses estranho
mestiços porque eles não são nada que eu já tenha vivenciado. Bah!
- Foco, Alice.
- Certo. Bella é quase fácil de ver agora.
Houve um longo momento de silêncio, e então Edward suspirou. Era um som novo, mais
feliz.
- Ela realmente vai ficar bem - ele respirou.
- Claro que vai.
- Você não estava tão otimista há dois dias atrás.
- Eu não podia ver direito a dois dias atrás. Mas agora que ela está livre de pontos cegos, é
muito fácil.
- Pode ser mais precisa pra mim? No relógio - me dê uma estimativa.
Alice suspirou. - Tão impaciente. Bom. Me dê um segundo –
Respiração lenta.
- Obrigado, Alice. - A voz dele estava radiante.
Quanto tempo? Eles não poderiam ao menos falar alto pra mim? Era pedir muito? Quantos
segundos mais eu queimaria? Dez mil? Vinte? Outro dia - oitenta e seis mil, quatrocentos? Mais
que isso?
- Ela vai ficar deslumbrante.
Edward grunhiu silenciosamente. - Ela sempre foi.
Alice bufou. - Você sabe o que eu quis dizer. Olhe pra ela.
Edward não respondeu, mas as palavras de Alice me deram esperança que talvez eu não me
parecesse com o carvãozinho que eu estava me sentindo. Parecia como se eu fosse ser só uma
pilha de ossos chamuscados agora. Todas as células do meu corpo foram reduzidas a pó.
Eu escutei o som de Alice saindo do quarto. Eu escutei o assobia provocado pelo movimento
dela, atritando nela mesma. Eu escutei o zumbido silencioso da luz do teto. Eu escutei o fraco
vento passando do outro lado da casa. Eu podia ouvir tudo.
Lá embaixo, alguém estava assistindo um jogo de baseball. Os Marines estavam ganhando
por duas corridas.
- É minha vez - Eu ouvi Rosalie resmungar pra alguém, e houve uma bufada em resposta.
- Hei, vocês - Emmett chamou a atenção.
Alguém assobiou.
Eu ouvi mais, mas não havia mais nada a não ser o jogo. Baseball não era interessante o
suficiente pra me distrair da dor, então eu ouvi a respiração de Edward de novo, contando os
segundos.
Vinte e um mil, novecentos e dezessete segundos e meio depois, a dor mudou. No lado bom
das coisas, começou a desaparecer da ponta dos meus dedos das mãos e dos pés. Desaparecendo
lentamente, mas pelo menos era algo novo.Tinha que ser isso. A dor estava acabando...
E então, a má notícia. O fogo na minha garganta não era como antes. Não estava só
pegando fogo, mas queimando também. Seco como osso. Queimando com o fogo, queimando de
sede.
Mais más notícias: o fogo no meu coração ficou mais quente.
Como aquilo era possível?
Meus batimentos cardíacos, já muito rápidos, aceleraram mais - o fogo os levou a uma
batida frenética.
- Carlisle - Edward chamou. Sua voz era baixa, mas clara. Eu sabia que Carlisle ouviria, se
eles estivesse dentro ou perto da casa.
O fogo parou de queimar minhas mãos, deixando-as felizmente sem dor e frias. Mas foi pro
meu coração, que queimava tanto quanto o sol e batia num velocidade alta e feroz.
Carlisle entrou no quarto, Alice a seu lado. Os passos deles eram tão diferentes, eu podia até
mesmo dizer que Carlisle estava à direita e um passo à frente de Alice.
- Escute - Edward disse a eles.
O maior barulho na sala era meu frenético coração, batendo em ritmo de fogo.
- Ah - Carlisle disse. - Está quase acabando.
Meu alívio em ouvir suas palavras foram encobertos pela excruciante dor em meu coração.
Meus pulsos estavam livre e meus tornozelos também. O fogo tinha se apagado
completamente neles.
- Logo - Alice concordou rapidamente. - Eu vou chamar os outros. Eu deveria falar com a
Rosalie...?
- Sim - mantenha o bebê longe.
O que? Não! Não! O que ele queria dizer com manter meu bebê longe? O que ele estava
pensando?
Meus dedos se mexeram - a irritação quebrando a minha fachada. O quarto ficou em silêncio
a não ser pela batida forte do meu coração enquanto eles todos pararam de respirar por um
instante em resposta.
Uma mão balançou caprichosamente os meus dedos. - Bella? Bella, amor?
Eu poderia respondê-lo sem gritar? Eu considerei aquilo por um momento, e então o fogo
ficou ainda mais quente no meu peito, drenando dos meus cotovelos e joelhos. Melhor não
arriscar.
- Eu vou subir com eles - Alice disse, uma urgência em seu tom e eu ouvi o assobio do vento
quando ela saiu.
E então –oh.
Meu coração ficou ainda mais rápido, batendo como se fossem hélices de um helicóptero, o
som era quase de uma nota em sustenido; parecia que ia saltar pela minhas costelas. O fogo se
concentrou no centro do meu peito, sugando as chamas remanescentes de outras regiões pra
abastecer a já potente chama. A dor era suficiente pra me abater, pra quebrar minh algema de
ferro da estaca. Minhas costas se arquearam, como se o fogo estivesse me puxando pra cima pelo
meu coração.
Não permiti que outra parte do meu corpo quebrasse quando o meu tronco bateu de volta
na mesa.
Começou um guerra dentro de mim - meu coração acelerado correndo contra o fogo. Ambos
estavam perdendo. O fogo estava controlado, consumiu tudo o que era combustível; meu coração
caminhava pra sua última batida.
O fogo se restringiu, concentrando-se dento daquele único órgão remanescentemente
humano com uma final, insuportável onda. A onda foi respondida por um profundo e audível
golpe. Meu coração vacilou duas vezes, e então bateu silenciosamente de novo só mais uma vez.
Não havia som. Nem respiração. Nem mesmo minha. Por um momento, a ausência de dor
era tudo que eu podia perceber.
E então eu abri meus olhos e olhei por cima de mim, maravilha.

(HELOISA SANTOS)